São Paulo é planejada, sim!

A Folha de São Paulo traz uma bela matéria sobre a Radial Leste (leia aqui), a principal avenida de São Paulo no que diz respeito a tamanho e uso.

A preocupação no momento é evitar que nossos visitantes peguem um grande congestionamento nos seis jogos da copa do mundo que acontecerão no Itaquerão, que fica em uma de suas extremidades.

Em minha opinião, como tudo com relação à Copa da FIFA 2014, preocupação exagerada. São 60.000 lugares no estádio, portanto, nada além de um Corínthians e Palmeiras… Ou seja, pelo menos disso a CET deve dar conta.

Seja como for, escrevo aqui por outro motivo. A matéria da Folha traz uma declaração em que digo que a Radial é uma das provas de que São Paulo é uma cidade planejada.

Pela primeira vez esta antiga tese que defendo, que vai na contramão da verdade absoluta repetida ad nauseam de que São Paulo cresceu desordenadamente, aleatoriamente, deverá ganhar um número significativo de leitores.

Nesta tese, defendo que dizer que a cidade não foi planejada, cresceu de modo espontâneo, de modo meio marginal, ao arrepio das forças legais e legitimamente constituídas é, na verdade, um enorme mecanismo de auto indulgência, que joga para baixo do tapete uma verdade que ninguém quer ver de fato:

São Paulo foi, sim, ao longo do século XX, uma cidade minuciosamente planejada. E, deliberadamente, pessimamente desenhada e construída.

Desenhada e construída com desleixo, sem respeito para com o cidadão, o ambiente e para com seu próprio conjunto de Leis e normas, sobretudo nas suas áreas de expansão ao sul e à leste. Fruto de uma política deliberada de fortalecimento do extrativismo urbano, que viabilizava o rápido parcelamento do solo – legal ou ilegal – e propiciava de um lado ganhos gigantescos e de outro o abrigo, a qualquer custo, do enorme contingente de mão de obra necessária ao desenvolvimento paulista naquele momento.

Esta tese não seria importante não fora o fato de que, enquanto continuarmos comodamente acreditando que a cidade cresceu, e por extensão, cresce, aleatoriamente, continuaremos sem a menor chance de superar verdadeiramente suas contradições e ajustar os rumos de seu crescimento.

Um exemplo disso, a recente obra de ampliação das marginais. Bilhões gastos (sem planejamento?) para manter um modelo de cidade que está em colapso, que já não se viabiliza, que já não nos interessa… Quer mais? As linhas aéreas de transporte coletivo construídas, coincidência, a sul e a leste… Quer mais? O atraso do Rodoanel, o silêncio em torno da necessidade de se fazer o ferroanel… Quer mais? As decisões tomadas no campo da Habitação e da qualificação dos espaços públicos.

Enfim, é chegada a hora de enfrentar o fato de que São Paulo foi planejada para ser o que é. Bonita, chique, equipada, funcional – até o transporte coletivo, mesmo que lotado, funciona – no eixo de altos investimentos centro-sudoeste e baixa, sem densidade, carente de serviços e muitas vezes de infra-estrutura básica, ilegal, das áreas a sul e leste.

Sem isso, não discutiremos com clareza e transparência o projeto futuro da cidade. E, assim, comodamente, as gerações futuras poderão continuar dizendo… é, mas São Paulo cresceu aleatoriamente, sem planejamento.

Valter Caldana

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