Um pequeno passo para a Prefeitura,
um grande salto para a cidade e a cidadania.
A Prefeitura de São Paulo finalmente lança mão e coloca em prática o IPTU progressivo no tempo, instrumento legal de operacionalização de políticas públicas de desenvolvimento urbano de grande eficiência previsto em nossa legislação há mais de dez anos e que não é utilizado, em geral por falta de capacidade política de nossos prefeitos.
No momento a Prefeitura indicou apenas pouco mais de 70 imóveis não utilizados ou sub utilizados no centro de São Paulo. No entanto, o conceito constitucional de função social da propriedade, de onde vem o instrumento legal, é mais amplo e é sempre bom lembrar que São Paulo, assim como a maior parte das cidades brasileiras, têm uma somatória muito grande de áreas subutilizadas, chegando a números surpreendentes que vão acima dos 30, 35%.
Não acho muito razoável abrigar esta ocorrência – a existência de uma grade somatória de áreas subutilizadas – apenas sob o rótulo da famigerada especulação imobiliária. A esta altura da vida esta é uma explicação simplista demais diante das complexidades inerentes à produção da cidade capitalista contemporânea. Afinal, a própria falta de crédito, políticas públicas claras, desenho urbano de qualidade e capacidade de investimento dos pequenos poupadores (que em outros tempos construíram bairros inteiros como Pinheiros, Vila Madalena, Freguesia do Ó, Jabaquara, Parada Inglesa e outros) explica boa parte dos imóveis sub utilizados. A especulação, claro, explica a outra parte.
O que abordo aqui, no entanto, é que dado este primeiro passo, que tem um profundo caráter didático, é bom lembrar que países como França, Alemanha, Holanda, EUA e outros utilizam mecanismos semelhantes, só que em geral ainda mais severos e mais onerosos para o proprietário, a partir de um conceito mais específico que o da função social da propriedade, que é o conceito de utilidade pública (que já foi muito usado no Brasil décadas atrás e anda adormecido).
Nele o proprietário de um imóvel, mesmo utilizado, pode ser induzido legalmente (forçado?) a participar de um projeto de reurbanização ou de desenvolvimento urbano que tenha sido elaborado pelo poder público. Para os mais velhos, vale lembrar que toda a área que se tornou hoje a nova Faria Lima havia sido colocada em disponibilidade desde 1968, permitindo que mais de trinta anos depois o projeto de prolongamento da avenida e reurbanização da área fosse implementado com o auxílio dos CEPACs.
Vale dizer que, deste modo, equívocos como os cometidos no projeto Nova Luz e mesmo no Casa Paulista, que em última análise transferem para a iniciativa privada o direito de desapropriação e usam este instrumento, a desapropriação, como praticamente única forma de obtenção de área para sua implantação podem ser superados. Claro, desde que sempre acompanhados de bons projetos urbanos, desenvolvidos a partir de concursos públicos e utilizando metodologias que privilegiem os mecanismos de consulta à população.
Por isso a aplicação do IPTU progressivo no tempo é tão importante, por ter quebrado a inércia conceitual e jurídica a que nos submetemos nas últimas décadas de apagão urbanístico. Precisamos, portanto, aproveitar este momento de tomada de consciência da importância da cidade na qualidade de vida do cidadão para ampliar esta discussão com a sociedade e ampliar a utilização deste e de outros instrumentos já existentes e fartamente utilizados, com muita eficiência e bons resultados, em várias outras partes do mundo.
Ou seja, não há a necessidade de inventar a roda e nem de usar aparatos jurídicos incomensuráveis. Aplique-se a Lei, que se façam bons projetos e que se conquiste o apoio da sociedade.
Simples…
Valter Caldana