A casa caiu.

ou de como a política é mais tangível do que parece.

Para tornar um pouco mais clara a gravidade do nosso distanciamento forçado dos processos de gestão da cidade, nunca suficientemente transparentes.

Um dos motivos, entre tantos, de haver tantas invasões na área central é o simples fato de que há uma enorme demanda por moradia ali e uma enorme quantidade de prédios vazios ou subutilizados.

Paradoxalmente há uma enorme quantidade de prédios vazios e subutilizados por que deixou de ser interessante explora-los comercialmente. Isto vale tanto para a iniciativa privada quanto para o poder público, ele também grande proprietário de imóveis nestas condições.

E por que deixou de ser interessante? Pasme, por que faltam pessoas para dar vida a estes imóveis… não se mantém comércio, serviços, etc etc onde não tem gente… Fecha-se o ciclo perverso.

Um dos responsáveis por esta situação é o Zoneamento de 1972, que perdeu completamente a validade nos anos 90, entrou em colapso nos anos 2000, ficou desastroso nos anos 2010 e hoje se tornou um cadáver insepulto. Sim pois o Zoneamento de 2016 é a reedição do Zoneamento de 1972. Tem a mesmíssima estrutura conceitual e metodológica e se serve dos mesmos instrumentos de inação, em que pesem os avanços (tímidos) do Plano Diretor de 2014.

Seja como for, ‘foi-se’ na revisão da Lei de Zoneamento uma primeira oportunidade (mentira, perderam-se tantas outras…) de ação direta e socialmente comprometida * na recuperação das áreas centrais.

Não satisfeitos, foi reformado o código de obras. Mais uma oportunidade perdida. Toneladas de regras, várias delas nascidas no código sanitário de Artur Sabóia há quase um século persistem… melhorou um bocado, sim, mas continua o mesmo ‘codigão’, anacrônico, que ignora os avanços da sociedade, da ciência, da tecnologia, da economia…. lá se foi mais uma oportunidade.

Aí, um dos instrumentos mais importantes, vitais para que o centro da cidade se reorganize social, espacial, territorial e economicamente, o retrofit (em português castiço) é previsto no PDE de 2014, precisa ser regulamentado, é de interesse de todos os agentes, e nada acontece em quatro anos.

E quando acontece, o assunto é colocado no bojo de uma revisão estabanada, mal proposta pelo ex prefeito, o breve, mal articulada posto que mal nascida do Zoneamento como um todo.

Zoneamento que, sem meias palavras, é ineficiente para a cidade real e atual posto que insiste em um modelo anacrônico mas que, seja como for, não pode ser alterado ao sabor do clima do dia pois bom ou não é ele que da segurança jurídica e institucional para a cidade funcionar.

Ou seja, colocaram a regulamentação do retroflito, um instrumento valioso, urgente e, acima de tudo eficiente no caldeirão de uma reforma no mínimo mal articulada do Zoneamento que não aconteceu e não acontecerá.

Enquanto isso, bem, enquanto isso a ‘casa’ caiu e gente morreu.

Valter Caldana

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Chamo aqui de socialmente comprometidas as ações que envolvem toda a estrutura e todos os agentes produtores da cidade, ou seja iniciativa privada (comércio, serviços), o mercado imobiliário especificamente, os movimentos sociais, os urbativistas, os defensores de interesses difusos e, claro, o poder público.
Ou seja, me refiro a ações que estão distantes do simples investimento estatal, como tem ocorrido nos últimos anos. O investimento estatal sozinho nunca fará frente às necessidades nem tampouco resolverá o problema pois trata-se de algo que não se resolve apenas com dinheiro mas sim com envolvimento e participação da sociedade.
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