Debatendo o bom debate (?):
Vamos para cima dos taxis ou vamos melhorar o serviço prestado pelas concessionárias?
A prefeitura e o MP estão cometendo um erro primário ao vilanizar o modal taxi neste momento de transição por que passa a estruturação do sistema de transporte público de São Paulo.
Trata-se de um posicionamento tomado a partir de uma visão meramente quantitativa, baseada em critérios que não levam em consideração a conjuntura onde será aplicada… Ou seja: a cidade, sua estruturação urbana, o uso do solo, sua cultura de apropriação do território e do sistema de transporte, seus desejos de mobilidade.
Não leva em conta adequadamente, por exemplo, a diferença entre viagens de longo percurso (que envolvem as populações periféricas, em geral as maiores vítimas do sistema) e viagens de curto percurso (que envolvem populações que habitam áreas centrais e consolidadas da cidade e os prestadores de serviço ao longo do dia).
Esta visão tem a mesma origem na insistência em montar todo o sistema baseado na pesquisa OD (Origem/Destino).
A isto se chamava, em outros tempos, visão tecnocrática do problema, que tanto nos atrasou e complicou a nossa vida e que, aparentemente, estamos ressuscitando.
O prefeito está se habituando, desnecessariamente, a tomar medidas corretas porém pela metade, o que as torna improdutivas e impopulares e, mais grave, comprometem a sua correção e sua implantação completa no futuro.
O milagre da multiplicação das faixas, por exemplo, é uma solução necessária e há anos sugerida pelos especialistas. Porém, não dá para simplesmente pintar as faixas e não intervir nas ruas transversais e nas paralelas, ali resolvendo questões de acesso de veículos particulares, estacionamento, carga e descarga, qualificação de espaços públicos, etc.
Neste sistema, por exemplo, os pontos de ônibus devem se transformar em pequenos polos de prestação de serviços – bancas de jornal, venda de bilhetes de transporte, quiosques de informação, venda de comestíveis (recém liberada)… As transversais devem abrigar estacionamentos, pontos de taxi, paradas de veículos, carga e descarga, pontos de bicicletas… As esquinas devem se transformar em estares urbanos. Tudo isto complementado pela revisão da lei de uso e ocupação do solo que se dará neste ano de 2014 e pelos projetos de bairro que acontecerão em 2015 (espera-se).
A pergunta que se faz é: onde estão estes projetos? Por que, se existem, não se dá a eles a necessária publicidade, para cativar a simpatia da sociedade e dar segurança institucional e política ao processo? Daí a percepção de que estão sendo implementados “pela metade”.
Mas, voltando ao equívoco em relação aos taxis nos corredores. Já considerei anteriormente que, neste momento de transição o passageiro do taxi não é (ainda) um a menos no ônibus mas sim um carro a menos na rua.
Não bastasse esta consideração, atentemos para o fato de que antes de abrir mais uma frente de embate público com parcela significativa da população usuária do sistema de transporte, o que deveria ser feito pela prefeitura é avançar sobre o cerne da questão, a qualidade dos serviços prestados pelas concessionárias do sistema de ônibus: o tamanho, a qualidade e a idade da frota, a lotação média dos veículos, os sistemas de controle de tráfego e o treinamento e a qualificação do pessoal.
Ou seja, a prefeitura deve investir pesado em sua função de reguladora inconteste do sistema, exigindo parâmetros de qualidade por parte dos agentes envolvidos compatíveis com suas próprias diretrizes.
Ao fazer isto ela estará melhorando não só a velocidade do sistema de ônibus, mas a qualidade do sistema de transporte e a qualidade de vida na cidade. E, então, conquistando parcela significativa da sociedade como sua aliada… até mesmo para, aí sim, tirar os taxis dos corredores.
Em urbanismo, infelizmente, a ordem dos fatores altera, e muito, o produto.
Valter Caldana