Brasil Potência

ou exportar é o que importa?

A queda do Real e o aumento dos preços dos produtos de primeira necessidade como gasolina e alimentos, somados às declarações e ações dos ministros e do presidente não deixam dúvidas sobre qual o projeto de país está sendo aceleradamente implantado no Brasil. Lembrando, sempre, com o apoio praticamente irrestrito de parcela majoritária da sociedade, que apóia este governo e, portanto, este projeto, seja por ação ou por omissão.

O que está em implantação é o bem antigo e conhecido projeto de fazer do Brasil um país extrativista, produtor e exportador de produtos primários. E só. Ponto.

Este projeto, ao gosto das nações mais poderosas do mundo e adequado aos interesses do capitalismo internacional e do capitalismo financeiro nacional se coloca em contraposição ao projeto industrial (e de serviços) desenvolvimentista, nacionalista ou não.

Nós vivemos esta batalha interna e este movimento pendular entre os dois projetos há mais de 150 anos… pelo menos desde a Lei do Ventre Livre. E, paradoxalmente, crescemos com a energia gerada neste confronto.

Há uma tentação de associar o projeto extrativista exportador de produtos primários à direita e o projeto desenvolvimentista à esquerda, mas isto é um equívoco. Há no pensamento da direita uma parcela importante que defende o desenvolvimento tecnológico e a produção de conhecimento, assim como é fortemente presente na esquerda a ideia de que a produção e mesmo a extração de primários gera excedentes necessários ao financiamento do desenvolvimento dos outros setores.

Assim sendo, a associação direta dos projetos aos posicionamentos ideológicos é uma espécie de armadilha. As nuances e dicotomias estão, na verdade, nos caminhos, velocidades e processos de implantação dos próprios projetos.

Entre os desenvolvimentistas as coisas são claras, mas os posicionamentos ideológicos se misturam na plateia. A prioridade é o desenvolvimento da capacitação tecnológica nacional como geradora de desenvolvimento em todos os setores, seja no campo (vide Embrapa e suas conquistas tecnológicas), seja no extrativismo (vide Petrobrás e suas conquistas tecnológicas) seja na cidade (vide antiga Embraer e suas conquistas tecnológicas).

Não por acaso, citei três exemplos criados e acalentados por pensadores ou por governos de direita, alguns, até, ditatoriais ou autoritários. Exemplos estes, porém, também fortemente incentivados pela esquerda. Poderia citar ainda, na mesma linha, a criação da USP, o Instituto Agronômico de Campinas, a figura do Barão de Mauá (que não me pareceu nunca ser um notório esquerdista…)

No âmbito do projeto exportador primário as coisas são bem mais claras e objetivas e o posicionamento ideológico bem mais ‘puro’. Temos terra para plantar, temos gente para colher, temos natureza para extrair e temos um montão de gente, mundo afora, precisando comer e precisando de matéria prima para produzir bens e serviços. Ora, pois eu vendo, então, comida e matéria prima. Simples e objetivo.

Neste momento, o pêndulo do poder está contemplando o projeto agrário exportador primário em sua versão fortemente extrativista, patrocinado pela direita unida.

Esta união da direita e a implantação deste projeto está sendo feita sob o pretexto de eliminar a esquerda. Vende-se a ameaça comunista, agora acrescida da ameaça comportamental da libertinagem homossexual, como elemento justificador das ações do governo.

Ocorre que, e talvez aí esteja o grave problema para o futuro da nação, do país e do Estado, o que está sendo eliminado não é a esquerda, mas sim o projeto desenvolvimentista em todas as suas variáveis e nuances. Daí o desmonte de todo o aparato de educação, ciência, arte, cultura, indústria, serviços de alta complexidade, produção de conhecimento, tecnologia, agregação de valor, lazer… A ideia facilmente identificável é que isto tudo se compra, não há a necessidade de produzir aqui.

Mas, mesmo assim sendo, qual a gravidade? A gravidade vem do fato de que algumas das coisas que estão sendo celeremente destruídas não terão recuperação. Estão sendo eliminadas, mortas. É diferente de serem apenas atrofiadas, mantidas em metabolismo mínimo para sua sobrevivência e florescimento quando o pêndulo do poder, soprado pela sociedade, mudar de lado novamente.

Quando isso ocorrer, as estruturas mínimas de sustentação do projeto não estarão mais lá. E o colapso, aí sim, se dará.

O que está em jogo, e a direita desenvolvimentista e nacionalista (ou não) aparentemente não está vendo, é a sobrevivência deste projeto, não a sobrevivência da esquerda. Não está vendo que significa a sua própria eliminação?

Vai reagir?

Valter Caldana

This entry was posted in cotidiano. Bookmark the permalink.

Deixe uma resposta