SOU MAS QUEM NAO É

Se a vaga é para o Theatro, quem vai controlar o seu uso?
E quem vai controlar se o sujeito está mesmo procurando vaga ou está usando a Barão para cortar caminho?
A Barão vai ser bloqueada em uma das pontas, de modo a não virar passagem?
Vai continuar proibido o trânsito de táxis? Sim, pois taxi, em tese, não estaciona. Ou vai poder dar só uma paradinha para deixar o passageiro, o dotô?
E os Uber, como vão ser controlados. Acham que não vão, pois não são. Para estes, liberou geral. Ganharam uma rua para chamar de sua. Pequenina, é verdade. Mas, uma conquista!
E se não houver vaga, se em função de botecos e do comércio da região, todas as vagas já estiverem ocupadas e não sobrar nenhuma para o Theatro? Mas, as vagas não eram para o theatro???
Vai haver uma credencial a ser recebida quando se compra o ingresso para o bolhete, que eu imprimo e coloco no vidro do carro, ou registro no aplicativo da zona azul, para garantir que o uso seja realmente do theatro?
As vagas serão usadas só quando houver função/ espetáculo no teatro ou serão usadas também quando o teatro estiver fechado?
As vagas, quem sabe, só poderão ser usadas pelos manobristas que estarão à porta do teatro em dia de espetáculo, onde obrigatoriamente o motorista deverá deixar seu carro para ser estacionado?
Estas vagas vão custar os olhos da cara, como em geral custam os estacionamentos em dia de espetáculo em todas as casas de show de São Paulo ou vai ter o mesmo preço tabelado?
Enfim…
Eu era criança e já havia pressão para liberar o trânsito no calçadão, em especial na Barão.
Agora, ao comércio local, ainda ligado na máxima no parking no business, se junta outro setor, o imobiliário, que várias vezes condicionou o sucesso de uma lei do retrofit (reformas com mudança de uso no centro) à existência de vagas para os possíveis apartamentos que possivelmente serão lançados, quem sabe, para repovoar o centro. E claro, se junta a própria concessionária da zona azul (se é que estas vagas serão dela, posso estar sendo injusto e equivocado, não pesquisei), que tem contrato por vaga, e não por serviço.
Bons e legítimos argumentos, aos dois setores, nunca faltaram.
Sim, pois para fazer o convencional, o que se faz em qualquer outro ponto (um AP uma vaga, uma sala uma vaga) não ter vaga complica.
Ocorre que o Centro não é convencional. É o Centro. É especial, precisa de projetos especiais.
O isto foi o que sempre faltou, os projetos e propostas alternativas que não fosse esta, liberar o trânsito. E, claro, por a mão no bolso.
Este é o principal motivo pelo qual até hoje estes argumentos nunca foram suficientes, e não são, para romper com um dos maiores, senão o maior ganho urbanístico que a cidade foi capaz de construir para si mesma.
Ao lado da Lei Cidade Limpa, que também está com a faca no pescoço e corre risco de morte iminente, a outorga onerosa, que funciona bem, e os PIUs, que a revisão do Plano fará involuir de projeto para programa, o calçadão que agora se macula oficialmente, à luz do dia, ainda que à noite, é estrutural para a cidade como um todo.
E, mesmo destruído, continuará sendo. Só que ao contrário. Pela baixa qualidade urbanística, pela baixa qualidade de vida. Exemplos disso na cidade não faltam. Só vamos dar mais um.
O que dói, conceitualmente, é ver a cidade andar para trás, assumir posturas ultrapassadas e comprovadamente ineficazes para lidar com seu cotidiano. E construir com vigor o seu próprio colapso.
O que dói, no coletivo, é a destruição do patrimônio.
É ver a cidade ser destruida pouco a pouco por falta de projetos inteligentes, que sejam capazes de equilibrar os interesses envolvidos. É assistir à perda do que recebemos como legado de qualidade.
No individual, no amor incondicional por São Paulo, é ser considerado um idiota. Que, certamente, sou. Mas, quem não é?

Valter Caldana

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