TERCEIRA VIA

Durante muitos anos a disputa entre os “cumpanhêro” tucanos e os “amigos” petistas se deu baseada numa espécie de briga de irmãos. Depois virou briga de família para se tornar briga de vizinho e, então, se tornar briga de boate de quinta categoria no meio da madrugada.
Deu no que estamos.
Esta briga em boa parte aconteceu porque ambos foram governar com quem e com o que sempre prometeram, se comprometeram e, nos seus inícios, se dispuseram a combater. Foram governar com o que há de pior na política nacional.
Seja como for, alguns poucos idealistas, ingênuos ou ignorantes, quando não os três simultaneamente, sempre viram uma certa complementaridade programática e a possibilidade de um trabalho conjunto entre os ‘amigos’ e os ‘cumpanheros’.
Isso numa perspectiva reformista, quando reforma queria dizer outra coisa, de viabilizar o diálogo entre ‘as massas’ e ‘azelite’. Ainda que para um tucano seja praticamente inviável perdoar a eleição de 1985 (ggrrrrr!) em São Paulo. E para um petista seja quase impossível perdoar a primeira leva de privatizações do governo FHC.
Faço estas lembranças sobretudo ao amigos que estão espantados, irritados ou mesmo inconformados com a chapa “sapo barbudo ao molho insosso de chuchu cozido”. Sem sal, pois agora já temos pressão alta.
Eu, um otimista profissional, quero acreditar que se trata de uma ação construtiva, comparável à ida ao colégio eleitoral por Tancredo, com Sarney como vice.
Comparável à unção de Marco Maciel a vice de FHC (quando FHC ainda tinha os bleisers xadrez miudinho de intelectual de esquerda), e comparável à escolha de Meirelles como presidente do Banco Central de Lula, não sem render tributo ao grande Vice Presidente José Alencar.
A diferença, e, a meu ver, perigo maior e origem do espanto, é que nas ocasiões citadas a máquina do poder, o poder real, imprensa à frente fazendo seu papel de fanfarra, abre alas e porta voz, estava jogando na conciliação, como sempre fez. Desta vez, não está.
Desta vez, a máquina do poder, o poder real, como vem fazendo desde 2013/14 (não vai ter copa) passou dos limites a que se impôs historicamente (1889, 1930, 1954, 1964, 1990) quando promoveu rupturas parciais, a seu ver profiláticas.
A partir de 2013, capitalizando 2011, e com o clímax em 2018, o poder real no Brasil não optou pela conciliação. Optou pela ruptura.
Ocorre que, na ruptura, os poderosos de fato nos ofereceram como alternativa este presidente e este governo. No pacote desprezaram o próprio Geraldo, Meirelles, o rapaz do novo…, que seriam mais conciliação. Não, optaram por Bolsonaro.
Parece que não gostaram tanto quanto queriam gostar, nem tudo funcionou (ainda que muito tenha funcionado) e, por isso, procuraram incansavelmente um candidato que faça as mesmas coisas, que cumpra o mesmo programa, que busque os mesmos objetivos, só que o faça com polidez e etiqueta.
Subvertendo a geometria, deslocando para a direita o conceito de centro, a isto chamaram de terceira via. Não acharam. A geometria é implacável.
Por isso, ainda creio que na hora “H” haverá um realinhamento em torno da reeleição do presidente. A ruptura em que apostaram foi forte, tomaram gosto pelo poder e não vejo menção de recuo.
No entanto, talvez a ideologia da conciliação – a tal da terceira via histórica – ainda não esteja totalmente superada e enterrada no Brasil. Está com seus dias contados, certamente, mas creio que ela ainda dará (ou tentará) dar seu canto do cisne.
E este cisne, ou este canto conciliador, que se materializa na chapa Lula + Alckmin que, me parece, para desgosto de uns e desespero de outros, seja, de fato, nossa tradicional terceira via.
.
.
.
.
.
.
…..
Não vou definir aqui o que seja poder real ou poder de fato no Brasil. Há uma vasta e brilhante obra a este respeito, onde eu destaco, com gosto, Raimundo Faoro e Carlos Guilherme Mota.
No anexo, um textinho de 2017…

Valter Caldana

http://debatendo.com.br/?p=2113

This entry was posted in cotidiano. Bookmark the permalink.

Deixe uma resposta