Como ainda se faz cidade

Deu no Estadão:

Favela com 7 mil barracos se forma às margens do Rodoanel

A leitura da notícia, a gravidade e a recorrência da  situação me levam a uma reação.

Vou falar uns palavrões…
“Desapropriação!” – sobretudo de grandes devedores de IPTU,

“IPTU Progressivo!” – para grandes terrenos e glebas urbanas ociosas,

“Liberdade de desafetação e comercialização de áreas e imóveis próprios para o Poder Público!”,
“Banco de Ativos Reais!”  - Estoque regulador de Terra Urbana!,
“Participação livre e apoiada institucionalmente dos agentes de mercado, sobretudo os pequenos empresários e empreendedores, no mercado de construção habitacional – Habitação de mercado popular e Habitação de Interesse Social!”
“ZEIS inteligentes!”  - bem situadas e com uso misto e geração de emprego e renda…!”


Enquanto não tivermos coragem de discutir estas questões aberta e livremente, sem achar que o Estatuto da Cidade (que no fundo, no fundo é fraquim…) foi escrito na Moscow de Stalin pela mulher do Mao Tsé Tung, este problema não terá fim.

Depois do Programa Minha Casa Minha Vida, que eliminou o problema de dinheiro disponível para superar o déficit habitacional no Brasil – mais de R$100.000.000.000,00 cem bilhões de Reais de investimento direto – e praticamente zerou o problema de acesso ao crédito por parte das camadas mais pobres da população, o que restou foi a triste verdade. A política funcionou, o Plano é bom, o Programa é abrangente, mas o Projeto é ruim.

Problemas gravíssimos de projeto das unidades e ainda mais graves, muito mais graves, de projetos urbanos.

Conjuntos Habitacionais – que passaram a se chamar empreendimentos – cada vez mais mal localizados, favorecendo a especulação com o valor da terra a partir dos mecanismos mais antigos que conhecemos na história da formação de nossas cidades. A reprodução do puro extrativismo urbano, que compra terra por alqueire e vende por metro quadrado, sem infra-estrutura, sem acesso, sem nada, obrigando investimentos altíssimos por parte do poder público para dotar as áreas do mínimo necessário para a sobrevivência e, deste modo, perpetuando a cidade espraiada, excludente, violenta, ambientalmente voraz, economicamente inviável e humanamente impossível.

A grande explicação para o fenômeno: o preço da terra urbana. O preço dos terrenos bem localizados. E, hoje em dia, o preço dos terrenos, mesmo os mal localizados.

Depois das chamadas jornadas de maio de 2013 não há mais o que esconder. A sociedade descobriu a cidade e a quer bem. Bem e funcionando, gerando qualidade de vida, felicidade, emprego, encontro, cultura, renda… Assim sendo, a sociedade descobriu a cidade e descobriu que a cidade é pública! É a base inconteste da Res Pública. A cidade é do cidadão.

É pela composição destes dois motivos, por que a cidade é pública, e por que o valor da terra impede produção habitacional de melhor qualidade que chegou a hora de encarar de frente a dura realidade.

Cabe ao Estado atuar explicitamente no mercado imobiliário, sim!

Não adianta mais atuar, como vem fazendo há décadas, de forma escamoteada, disfarçada, fingindo ser um grande respeitador da livre iniciativa e continuar usando instrumentos pseudo-invisíveis e saturados como os planos diretores, as leis de zoneamento, os incentivos fiscais, a planta de valores, isenções de IPTU e, mais recentemente, o solo criado, que cria estoques de terra virtuais.

Cabe ao Estado, como o fazem EUA, Inglaterra, França, Alemanha, atuar como agente explícito no mercado, usando seu poder de compra e venda para regular estoques e preços. Aliás, do mesmo modo que faz, e com grande sucesso, na agricultura.

Até mesmo para que, no mínimo, a sociedade possa saber e acompanhar como, onde e por quem são aplicados os recursos no setor. E, deste modo, possa usufruir coletivamente de seus resultados.

Valter Caldana

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