Alto e magro ou baixo e gordo? II

(continua de Alto e magro ou baixo e gordo?)

Que número o senhor usa?

Está nas bocas e mentes das pessoas mais diretamente envolvidas, de políticos e funcionários públicos a técnicos, movimentos populares e mercado imobiliário a alteração do Zoneamento proposta pela atual gestão.

Assunto importantíssimo, pois vai mexer, de novo, pouco mais de uma ano após a promulgação de sua última versão, com a Lei mais importante para a composição de valor e preço da terra urbana da cidade: a Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo. Esta pega todo mundo, ninguém escapa dela. Quem tem, quem não tem, quem quer ter e pode ter, quem quer ter e não consegue. Pega até quem não quer nada.

Ela possibilita ou impede, na prática, que se faça uma boa política habitacional ou que surja uma adequada rede de comércio e serviços perto de sua casa, facilitando a sua vida. Ela viabiliza uma boa mobilidade e, pasme, melhora o trânsito. Ela influencia, para simplificar, até mesmo o preço do pãozinho vosso de cada dia pois o valor do aluguel que o dono da padaria paga é, em parte, determinado por ela.

Isto tudo por que, como todos sabem, é ela que regula o quê e quanto se pode ou não fazer em cada terreno da cidade. Daí sua importância.

Como braço operacional do Plano Diretor, ela também deveria ser uma Lei de médio prazo de validade, no caso 16 anos. Isto se dá para que ela possa gerar efeitos, (seus efeitos não se sentem no curto prazo) e, principalmente, por que ela é responsável pela segurança jurídica das transações imobiliárias cotidianas.

Imagina você comprar um apartamento num bairro que tem determinadas características e pagar x mil por ele justamente por isso e, no dia seguinte ou na semana seguinte, alguém mudar a Lei e alterar todas estas característica. De um lado, você pode ganhar na loteria. Por outro, pode perder tudo, a poupança de uma vida…

Enfim, o assunto é tão importante que mereceu certo destaque na imprensa através de uma longa entrevista da Secretária de Urbanismo responsável pela proposta de alteração da Lei e dois artigos, um dela própria e outro do ex secretário Fernando Franco, um dos formuladores da Lei original, na Folha.

O que se nota nos dois artigos, e nas discussões, é que há concordâncias nos pontos principais. A atual secretária Heloísa Proença reconhece o acerto e a importância da manutenção das diretrizes definidas no Plano Diretor, que altera a territorialização do desenvolvimento urbano da cidade e, por sua vez, o ex Secretário Fernando Franco admite a legitimidade da proposta da atual gestão, ainda que dela discordando.

A polêmica, desta vez, está se dando em função da proposta do governo trazer a flexibilização das alturas dos edifícios no que alguns técnicos estão chamando de remansos – não deixa de ser poética a palavra – ou miolo de bairros. É isto que está, por assim dizer, na boca do povo. E os artigos e comentários a eles subsequentes corroboram esta discussão.

Limitados pela última Lei a 28 metros de altura em geral (três metros a mais do que a legislação anterior permitia, diga-se), que possibilita, com jeitos e jeitinhos, a construção de uns dez pavimentos mais cobertura duplex, etc e tal, se esperaria que estes edifícios nos miolos de bairro, por ‘baixinhos’, não causassem problemas e passassem praticamente desapercebidos pela cidade e pelo cidadão. Quase incógnitos… Uma espécie de agente ‘sombra’ ou ‘homem invisível’.

Por outro lado, argumentam os agentes tradicionais do mercado imobiliário, este limite subutiliza terrenos e encarece a obra, dificultando o acesso de um maior número de pessoas à moradia em áreas centrais, como é desejado pelo Plano Diretor, e diminuindo as margens de lucro dos empreendimentos. Ou seja, um jogo de perde perde em vez de ser um jogo de ganha ganha.

Porém, e aí passo do limite do atrevimento, ao se assumir esta discução nestes termos o que temos é a reprodução, mais uma vez, em menos de dois anos, do jogo de erra erra.

Assim como se deu com a discussão sobre as Zonas Exclusivamente Residenciais – ZERs no processo anterior, que mesmo sendo importantíssima uma vez inflada ofuscou a discussão ampla de questões estruturais de interesse coletivo, o que se tem agora é muito semelhante.

Se erra ao se confundir o foco da questão e se erra, por isso mesmo, na construção da resultante pretendida.

Valter Caldana

(segue)

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