E o estádio é público…

E o estádio é público…
kkkkk
Não sou um sonhador, sou um idiota.

Vai aí mais um texto, este de 2011, encontrado nas nuvens. Foi encomendado por um jornal, mas não me lembro se foi publicado.

_______________________________________________________________

SOBRE COPA, ESTÁDIOS E INVESTIMENTOS EM SÃO PAULO

De início temos que simplificar esta discussão. A inclusão de infindáveis variáveis numa questão desta monta e desta natureza interessa sobretudo àqueles que se locupletam e se beneficiam indevidamente com o esforço de muitos. Como se diz, a pressa é amiga da corrupção.

Outra premissa fundamental é que se defina clara e rapidamente que nenhum tostão público deve ser gasto com a construção, reforma ou ampliação de estádios na cidade de São Paulo ou na Região Metropolitana.

Se a Copa é bem vinda, ela o é sobretudo como catalisador de investimentos que já deveriam ter sido feitos ou que demorariam muito tempo para acontecer. E construir ou ampliar estádios de futebol ou arenas multiuso como se diz agora, do ponto de vista do investimento público direto, definitivamente não se enquadra em nenhum dos dois casos.

Assim sendo, qualquer obra tem que ser absolutamente privada, definida de acordo com o interesse público e estar prevista em planos de desenvolvimento urbano e melhoria da qualidade de vida na cidade.

Portanto, qualquer investimento, mesmo os privados, deve atender a estes critérios e deixar, de forma indelével e definitiva, sua contribuição para a consecução mais rápida daquilo que já estava previsto. E planos, como todos sabem, temos muitos. E bons.

Deste modo, não se pode alterar os rumos da cidade para receber a Copa. Ao contrário, o que se defende aqui é que se mantenha o rumo, mais firme do que nunca. E a Copa seja o combustível oportuno para acelerar a caminhada.

A Copa, as Olimpíadas e outros mega-eventos como a Expo Universal – que em breve deveremos ter em São Paulo também, por que não? e tem muito mais a nossa “cara” – são uma boa idéia antiga, do século XIX. Todos sabem que a Tour Eiffel, por exemplo, é símbolo de um destes mega-eventos. E a região da Expo, em Lisboa, também.

Neste sentido, entendendo os mega-eventos como catalisadores e não como geradores ou redirecionadores de rumos, temos que ser firmes também na simplificação da discussão sobre os mesmos. E temos que ficar alertas com relação ao seu uso e com os destinos e a durabilidade dos benefícios que geram.

Há algum tempo insistimos na ideia de que a cidade deixou de ser palco para se tornar atriz, protagonista do teatro da vida.

Hoje a cidade, ‘como nunca antes na história da Humanidade’, se tornou agente, partícipe da geração de qualidade de vida, de cultura, de lazer, de educação, de segurança, de negócios. Em poucas palavras, a cidade, ao definir a (im)possibilidade de acesso, agrega valor. E, se agrega valor, não é paciente, é agente.

Outro aspecto é o de que não podemos correr o risco ficar mais duas décadas pagando uma dívida impagável.

Impressionam a simplicidade e a sem cerimônia com que se falam os números dos orçamentos da Copa. A palavra Bilhão voltou ao cotidiano do noticiário como unidade! Agentes públicos e privados falam em “qualquer coisa como um ou dois bilhões…” com uma sem cerimônia e uma irresponsabilidade impensáveis, nos fazendo lembrar dos algarismos e dos zeros à esquerda dos melancólicos últimos minutos do cruzeiro…

Já paramos para pensar o que significa isso? Que intervalo é este? Que margem de tolerância é esta? As pessoas sabem o que é 1.000.000.000,00 de reais?

Sofremos muito, todos nós, durante 20 anos, para pagar uma dívida discutível, contraída e usada, em boa parte, de forma ligeira… Inclusive fazendo estádios!

Nós, os sobreviventes desta jornada, temos ainda um sopro de tempo para usufruir o resultado deste esforço. E não vamos querer deixar para nossos filhos, para as gerações futuras, uma conta como a que recebemos, que se paga com frustrações, atraso e morte.

Por isso acredito que a discussão sobre os estádios da Copa, particularmente os paulistanos, deva ser travada a partir destas premissas: simplicidade, objetividade e utilidade, tudo isso, claro, com bom senso e espírito público.

E, neste sentido, como exemplo desta postura e desta discussão, acredito que poderíamos verificar a possibilidade de que o estádio da Copa fosse o Estádio do Pacaembu. Sim, um estádio público!

Um estádio público que deve e pode, sobretudo por ser um bom negócio, ser reformado com investimentos privados.

Sugiro a reforma do Pacaembu – mais apropriado falar “modernização” para agradar à FIFA – sem que se cometa o desatino de fazer uma cobertura, com a rápida demolição daquela infeliz intervenção que é o tobogã e, principalmente, a reconstrução da concha acústica… que garantirá a sua multifuncionalidade.

O estacionamento? Calma FIFA, o estacionamento, este se faz na Barra Funda ao lado da inexorável estação intermodal do trem que deve ligar Congonhas a Cumbica. Este sim um investimento urgente, que já deveria estar pronto há anos, e que teria evitado boa parte do caos aéreo recentemente vivenciado no Brasil. E previsto em vários planos para a cidade e para a região metropolitana.

Como funcionaria? Em dias de jogos uma ponte de veículos leves (movidos a gás ou elétricos) entre o estacionamento e o estádio… o transfer, ou a estação de chegada, pode ser construído, simples e eficiente, na Charles Muller, que será obviamente restaurada, uma vez que foi destruída na construção do piscinão, como todos nos lembramos.

E os pontos de apoio para delegações, jornalistas e cartolas, patrocinadores e convidados?

Um convênio com a Fundação Faculdade de Medicina para o uso da área lateral, que abriga uma belíssima e importante obra de Ramos de Azevedo e possui uma grande quantidade de terreno disponível para a construção de estruturas de apoio, também facilmente aproveitáveis pela Universidade de São Paulo após os jogos.

Resta o problema da capacidade. 60.000 lugares para a cerimônia de abertura.

Sei, de leitura de jornais, que na África sobraram ingressos…

Não tenho como discutir a origem ou a correção deste número. Mas posso discutir que, para São Paulo, a construção de mais um equipamento com capacidade para abrigar 60.000 pessoas (lembrar que com a utilização do gramado, em dias de eventos não esportivos, esta capacidade é ainda maior) não encontra respaldo na realidade. Basta ver qual o índice médio de utilização e lotação do Morumbi. Assim sendo, talvez este item seja um filtro direcionador de uma decisão que já esteja tomada, e não explicitada.

O fato é que, a utilização do Pacaembu é mais simples, mais barata, a obra fica pronta em no máximo dois anos, tem grande utilidade posterior e o estádio é público.

Um abraço a todos.

Valter Caldana

This entry was posted in cotidiano. Bookmark the permalink.

Deixe uma resposta