Quem paga?

Há um paradoxo seminal na ideologia Liberal de Estado, uma mutação surgida no Brasil em virtude da leitura tosca do Liberalismo Clássico e do Neoliberalismo recente. Paradoxo que é provocado pelo comportamento das corporações que a geraram e a promovem.

Enquanto no Liberalismo os pilares do Capitalismo – produção de conhecimento, inventividade, empreendedorismo, investimento, risco, competição, eficiência e sucesso – são levados à uma alta potência, em especial conhecimento, investimento, risco e sucesso, aqui o liberalismo de Estado só funciona a partir de privilégios corporativos e setoriais bancados pelo Estado com dinheiro público. Em geral com espantosa liquidez e investimentos diretos a fundo perdido, ou sob o manto diáfano das renúncias e anistias fiscais. A modalidade mais sofisticada deste mecanismo tem sido a injeção de capital e o saneamento de empresas e patrimônio públicos pré-venda, que é feita em seguida, não raro com o financiamento também público da operação, realizada na bacia das almas.

Entenda-se por público, aqui, o seu dinheiro, o resultado do seu trabalho. Mas, até aí não há nada de novo no quartel d´Abrantes. Sob nuances e nomenclaturas, isto vem vindo assim desde o Império.

Então, onde está a contradição?

A contradição está no atual discurso desta corrente ideológica hegemônica no Brasil que prega (até aí morreu neves, falar é fácil e rende votos) e agora promove (aí pegou!) o desmonte, a dilapidação e, em alguns casos, a simples destruição do Estado e de seu patrimônio. Do Estado que é, na prática, a fonte de sustentação de toda a operação capitalista brasileira.

Afinal, basta observar empiricamente. Toda vez que alguma empresa de porte, cadeia produtiva ou setor se encalacram por questões conjunturais ou estruturais, por falhas de gestão, porque seu modelo de negócio desanda por falta de investimento de risco ou porque sua eficiência cai a zero por falta de conhecimento prosaico ou de ponta (este cada vez mais comprado do exterior a peso de ouro, digo Dólar a 5,5, digo Euro a quase 7) é a mão amiga do Estado que socorre. Exatamente como manda a cartilha ideológica do liberalismo-estatal.

Porém, destruído o Estado, deixado à míngua, sem patrimônio e sem condições instrumentais de fazer política pública rentável – já não tem telecomunicações e distribuição de energia, em breve deixará de ter geração de energia (Eletrobrás, Petrobras) comunicação física (Correios), instrumentos financeiros (BNDES, BB e Caixa), mineração já foi faz tempo, patrimônio físico edificado está incendiado, à venda ou em petição de miséria e cuja produção de conhecimento vem em franco estrangulamento e deve fenecer completamente em breve, a pergunta é: num modelo que depende do Estado, sem ele (de verdade, não no discurso fácil), de onde vai sair o dinheiro para continuar irrigando as cadeias produtivas e socorrendo-as nos momentos de crise, cada vez mais frequentes?

Por enquanto, ainda vai. Mas, até quando?

Valter Caldana

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