Não faltam no Brasil monumentos a nos lembrar cotidianamente nossas decisões político-técnicas que oscilam entre o inexplicável e o injustificável…
Mas, voltando hoje de um passeio ao aeroporto depois de 20 meses de isolamento, me ocorreu que pouca coisa é mais eloquente e simbólica desta nossa condição de semi-indigência periférica do que GRU érporti…
A começar da retirada de nosso direito a um mínimo de dignidade no batismo de um aeroporto (humilhação que é reiteradamente repetida no indecifrável sistema de som, bem vindo ao gruérporti), seguindo pelo TPS-03, sua localização, sua implantação, sua arquitetura e seus percursos insondáveis, inexplicáveis e quilométricos, continuando pelo trenzinho que não chega (e se não bastasse não chegar, o que dizer daquela estrutura de concreto que o sustenta ‘no ar’, leve, como linda, leve pluma, leve e solta, serpenteando e destruindo tudo a sua volta, consumindo um volume de concreto que daria para resolver boa parte de nosso problema habitacional…), passando por todo o sistema de destruição dos córregos e cursos d’água abundantes na área, pela vegetação em franco desaparecimento e, claro, culminando nos dois presídios coroando o conjunto, pouco antes da magnífica chegada à marginal.
Vale lembrar que este presente é fruto das decisões político-técnicas do passado, a começar da mais conturbada que foi colocar ali o aeroporto civil destinado a ser o maior do país, passando por meio século de outros equívocos e procrastinações. Conjunto que vem comprometendo definitivamente nosso futuro.
No entanto, me ocorria observando as cenas, o quanto nossa participação técnica, colegas engenheiros e arquiteto e urbanistas, economistas e advogados, e outras profissões corporativas envolvidas, está indelevelmente presente nestes processos decisórios políticos, marcada no seu corpo feito tatuagem…
Se a decisão política tende a ser a pior, fruto da contumaz ignorância (derivada de um sistema de ensino pífio) e do autoritarismo atávico dos políticos, apesar de sua legitimidade, o fato é que não dá mais para jogar para baixo do tapete voador da auto indulgência corporativa o fato de que ela se dá, a decisão, pelo agente político que tem a responsabilidade de tomá-la, a partir de um elenco de possibilidades e projetos que lhe são fornecidos pelo aparato técnico envolvido…
O projeto não é deles, dos políticos decisores. Deles é a obrigação da encomenda e a responsabilidade da escolha e decisão entre projetos resposta que lhe são apresentados.
Decisões não nascem do nada, tanto quanto tapetes não voam.
Ainda.
Valter Caldana