O Brasil vai parar?

Começa a ser perigosa, mais do que trágica, cômica ou enfadonha, a insistência de setores nacionais e internacionais na inevitável debacle brasileira.

Há pelo menos três anos, mais ou menos ao mesmo tempo em que a segunda onda da grande crise do capitalismo internacional vicejou europa afora, ao mesmo tempo em que o governo brasileiro tentava uma baixa forçada das taxas de juros praticadas contra o consumidor e os empreendedores e mais ou menos ao mesmo tempo em que o Brasil passou a dizer não aos constantes achaques e chantagens da insaciável FIFA pedindo mais e mais dinheiro, que o que se ouve é…. a inflação vai explodir, a economia vai desandar, acabou o sonho… imagina na Copa, não vai ter Copa!

Veio a Copa, tudo deu certo, inclusive o time do Felipão, que conseguiu, mesmo sendo medíocre, ficar em quarto lugar. Quem não se deixou levar pela onda do “imagina na Copa” ganhou um bom dinheiro, quem acreditou dançou. E perdemos de 7×1 para nos lembrar, do jeito mais doloroso, quem é que manda no mundo hoje.

Além disso, o governo insistiu – e aqui vem uma polêmica saudável – em combater a crise gastando e incentivando o consumo, numa chamada política anti-cíclica que fez com que os efeitos da crise aqui fossem muito, mas muito mais brandos que nos países centrais, mas fez também com que a retomada do crescimento em níveis ufanistas se dê da mesma forma, lenta. Isso sem falar que as “poupanças” reais e virtuais foram gastas.

Se o governo esteve certo em atenuar a febre no momento agudo da crise com uma aspirina caríssima para depois fazer um tratamento eficiente ou se ele apenas gastou um dinheiro grande num placebo e não conseguiu atacar as causas internas da doença, que é externa, os próximos dois anos (e não dois meses) dirão.

Passou a Copa, teve a Copa. Nos três anos em que se vaticinou que a inflação iria estourar ela ficou dentro da meta. No topo, é verdade. Mas se existe a margem, base, centro e topo, é exatamente para que em momentos difíceis se possa ir ao topo, em momentos de desarranjo se possa ir à base e em momentos de normalidade se possa ficar no centro. Logo, também aí as previsões catastrofistas se equivocaram. Mas insiste-se que este país vai mal, muito mal.

Então renasce com vigor a “ojeriza nacional” com a corrupção. O mar de lama sob o catete. Tal qual normalistas histéricas, pela enésima vez a sociedade descobre que temos um aparelho de Estado estruturalmente corrupto, como se este já não fosse um fato fartamente conhecido e sistematicamente tolerado e reafirmado. E mais, com a privatização do Estado na década de 90, o que se tem é que ele se tornou, com o nosso beneplácito, um balcão de negócios, a ponto de corruptos – agentes de estado e da iniciativa privada – terem dificuldades de entender suas culpas!

Então veio a Operação lava-Jato. Delenda Petrobras.

Mas algo de novo aconteceu. As investigações puseram mão pesada sobre os corruptores, que eu melhor definiria como agentes privados no esquema de corrupção. Isto é novo, começou timidamente com a prisão de uma banqueira no mensalão e agora se ampliou. Isto é bom. Isto é avanço.

Só que agora a ideia é que com as investigações indo no âmago das mega empreiteiras, o Brasil vai parar. Sim, pois todas as grandes obras do governo estão na mão delas e se as mesmas forem descredenciadas ou sofrerem grandes perdas tudo parará e o país, enfim, acabará. Aqui, um exemplo [leia aqui].

Não acho que seja bem assim.

Provavelmente todas as grandes obras do Brasil, nos três níveis de governo, (e também as de alguns países sul-americanos, de alguns países africanos e do Iraque) DESDE Brasília até hoje tiveram a participação de pelo menos uma das empresas investigadas na Lava-jato.
E, sabe o que é bom? Bom não… é ótimo?
Estão sendo investigadas e estamos sabendo!!
O bacana aqui é que não estamos chovendo no molhado, investigando políticos de plantão.
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Portanto, espero que tenhamos menos gritinhos de escândalo, e mais ação efetiva para encarar o problema real (e não seu subproduto petroleiro) e para saber como sairemos desta encrenca.
Qual a proposta da sociedade? Qual a proposta do(s) governo(s)?
Basta reformar a 8.666, uma Lei feita pelo lobo para regular as atividades do galinheiro?
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O Brasil vai parar? Não, não vai!
E sabe por que?
Por que estas empresas detém o processo político orçamentário licitatório (ou seja, controlam as contratações), mas não controlam, de fato e sozinhas, o processo técnico construtivo. Ao longo dos anos se tornaram grandes gerenciadoras de processos, projetos e obras, terceirizando e subcontratando a maior parte das ações. Se tornaram gatos gigantescos e famintos, insaciáveis. Que vão acabar por se auto consumir.
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Isto quer dizer, sim, que talvez tenhamos atrasos e tenhamos que recontratar, provavelmente por menores preços, as mesmas empresas que estão fazendo, de fato, as obras.

Falei isto tudo só para lembrar que se o Brasil valorizasse projetos, e acreditasse que PROJETOS EXECUTIVOS feitos por equipes independentes são a ÚNICA garantia que a sociedade tem de preço justo e qualidade na execução de uma obra, qualquer hiato neste momento ficaria muito menor, mais leve e mais facilmente superável.
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Que as investigações continuem firmes, e cada vez mais amplas. Para aprendermos de verdade com tudo isso.

Valter Caldana

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