ANUNCIADOS

Desde 2019 já se sabia, tanto por simples observação visual quanto por análises feitas por agentes públicos e privados responsáveis pela aprovação de projetos em São Paulo que havia graves distorções do plano diretor em andamento, praticamente todas elas fruto de problemas igualmente graves de redação, que geraram licenciosidades de interpretação.
Motivo pelo qual passei a defender, já em 2019 e mais fortemente em 2020 que estes problemas de redação, de interpretação e de regulamentação deveriam ser o único objeto da revisão do PDE prevista para 2020/21.
Estava claro onde estavam as principais distorções, as principais interpretações criativas dos textos não menos criativos de Lei e o efeito nocivo que estavam provocando sobre os bairros de classe média consolidados da cidade, na chamada segunda cintura.
E, pior, muito pior, a ineficácia do Plano, pelos mesmos motivos (textos problemáticos e interpretações distorcidas) nas áreas não centrais da cidade. Não centrais, não consolidadas, não equipadas ou super equipadas da cidade, que mais uma vez estavam de fora da política de desenvolvimento urbano integrado.
A opção politica que se fez foi adiar a revisão para supostamente ampliar a discussão, a ponto de fazer um plano novo e não apenas uma revisão como estava previsto.
O que se deu depois todos sabem. De modo geral o que estava ruim permaneceu ou piorou e o que estava bom se distorceu mais. E quem estava fora fora permaneceu.
Claro que há pontos aqui ou acolá que adocicam a situação, mas estruturalmente o PDE involuiu e seu braço executivo, o Zoneamento, desembestou, como se dizia muito antigamente lá na minha Vila Tibério…
Tudo isso para dizer que é preciso um pouco mais de atenção e cuidado com estas notícias que estamos lendo. Importantes, elas estão lançando luzes, passados 5 anos e bairros inteiros demolidos e refeitos, sobre uma distorção que foi avisada no texto em 2014, no texto em 2016 (zoneamento), na revisão do PDE de 22 e na revisão do zoneamento em 2023 e 2024…
E mais, também é importante lembrar que esta visão de cidade e de empreendimento foi reeleita com enorme margem de dianteira. Mais de 1.000.000 um milhão de votos à frente do segundo colocado, fora as abstenções que, se considerado o desinteresse, podem ser computados para o vencedor.
Ilegalidades se reprimem e se punem. Mas, não são estas, pontuais, que compõem o problema, que é estrutural.
Não dá para manter o nível da discussão tão baixo e desinformado diante de quadros tão recentes, macroscópicos, basta ver o tamanho dos prédios e seus efeitos na cidade, e fartamente anunciados.

Valter Caldana

https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2024/11/14/bairro-nobre-de-sp-vila-olimpia-tera-moradia-social-de-r-15-milhao.htm?fbclid=IwY2xjawLiECVleHRuA2FlbQIxMQABHgnuY3GkNTpsMpFm5o3xywpD5aaSKCcOOsXg0Z_710dcKVEUGvKvzk2pYtq6_aem_SiNEH6thSN-QIzyU9q8O2A

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ATÉ EU

Quando falo insistentemente que São Paulo é uma cidade minuciosamente planejada, para ser como é, às vezes soa um contra senso.
Neste final de semana ocorreu aqui um bom exemplo de planejamento oculto, ou mimetizado às condições da realidade. O GP de F1.
Quem acha que foi uma bagunça, que azar a chuva forte, etc… não está levando em conta um detalhe.
Todo mundo sabe que chove em finados. Ou, sendo um pouco mais rigoroso, todo mundo sabe que a chance de chuvas neste final de semana é elevada. Portanto, não houve novidade.
Ora, então quem marca um GP justamente neste final de semana certamente chuvoso?
Talvez as mesmas organizações que recentemente cogitaram molhar a pista antes do treino ou inventaram de fazer GPs à noite, com um sistema de iluminação perfeito que deve consumir a energia de uma cidade…
Enfim, a “chuvinha” veio em boa hora, o espetáculo foi incrível, fortes emoções… Tudo planejado e todos tem assunto para mais de metro.
Até eu!! Kkkk

Valter Caldana

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ENTRE SI

Havia um jovem deputado ontem na porta da Bolsa bastante entusiasmado, bradando que foram eleitos para privatizar o estado todo e que vão fazê-lo. Saúde, educação, transporte, etc. Tudo, anunciava ele.
Ele estava lá acompanhando o governador que iria vender o primeiro lote de escolas. O que não é meu assunto aqui.
Ele, o deputado, exalava um sincero entusiasmo, naquele vigor da juventude que é respeitável.
Mas, de significativo mesmo na fala do deputado me chamou atenção uma coisa. Foi a primeira vez que eu ouvi em público, com tanta sinceridade, que vão privatizar todo o estado, e o Estado, porque é uma opção ideológica e não uma necessidade. E que é uma vitória eleitoral, um mandato, algo que comento faz tempo.
Ou seja, foi a primeira vez que ouço oficialmente que não se está privatizando porque precisa fazer caixa para sobrar dinheiro para saúde, educação, segurança… mas apenas porque se acredita que tem que privatizar, vender as funções e o patrimônio do Estado.
Isto tem duas consequências, a meu ver.
Uma é que quanto mais clara ficar a motivação da privatização do patrimônio público, mais legítima ela será.
O eleitor vai votar pela venda de seu patrimônio porque acredita que não precisa mais dele, e não porque acredita que precisa vendê-lo. E, então, vai finalmente parar de dizer, diante de cada agrura ou desafio cotidiano, “o governo tem que fazer alguma coisa”. Não! Caríssimo, você tem que fazer alguma coisa.
A outra é que a esquerda e a centro-esquerda, que andam precisando acordar e dar uma boa revisada nos seus projetos, nos discursos e nas suas ações talvez possam se sentir mais solta e superar a vergonha de defender o Estado e o estado e, quem sabe, até estatizar ou reestatizar serviços e patrimônio perdidos onde lhes reste um quinhão de poder. Apresentar alternativa.
Este talvez seja um bom caminho para nós, eleitores, podermos escolher entre a verdade dos fatos e superarmos a situação vivida nas últimas municipais, onde mais uma vez se nos apresentaram basicamente uma lista desconexa de obras, todas ‘do governo’ , na prática equivalentes e muito parecidas entre si.

Valter Caldana

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VOTA

Como sou arquiteto, o que vou falar não corre o risco de parecer opinião de engenheiro de obra pronta, risos… mas, vamos lá.
Há dois anos o presidente Lula e o ministro Haddad venceram a eleição na capital fundeados e alicerçados num arco de alianças bastante claro.
O vice-presidente Alkimin deu uma aula magistral de política, clareza de posicionamento e firmeza de decisão (!) e o presidente fez, as usual, mais uma de suas mágicas. Compôs um arco de alianças como poucos conseguem, mas que o paulistano gosta.
Neste arco e naquela eleição Boulos bateu recorde de votos e Tábata também, as duas jovens lideranças oriundas dos dois campos ali associados. O eleitorado paulistano entendeu, atendeu e votou nos dois com folga e clareza.
Ano e meio depois, com a economia razoavelmente estável, o acordão funcionando lá em cima, o que restaria fazer para disputar a eleição onde uma chapa/aliança clara já havia vencido, ano e meio antes, com folga??
Super simples, disseram alguns gênios da política profissional, inclusive os candidatos, a candidata e seus padrinhos:
Basta romper a aliança,  lançar candidaturas distintas, depois deixar a Tábata cair no conto do Datena, depois chamar a Marta de seu retiro na secretaria do prefeito, aí abrir espaço para o psdb inteiro cair no conto do Datena, aí a Tábata cair no conto do Datena de novo, aí o Boulos fazer toda a sua campanha falando de um assunto só para um público só para, então, com toda esta lambança, todos juntos, prefeito inclusive, abrirem espaço para o Marçal.
Então. Ontem o prefeito foi reeleito, 1.000.000 de votos de diferença, o governador deu passadas kilométricas para colocar bolsonaro na coleira e no cercadinho, ambos, prefeito e governador tem os cofres cheios, muito cheios e uma economia estável que, como se viu no Brasil todo, favorece quem lá já está e hoje, meia noite, começou a campanha presidencial.
Não falta DR. Falta juízo, e sobra empáfia e soberba para um campo. E tem sobrado tenacidade e crua objetividade ao outro campo.
Mas, o que interessa (e por mais que isso fique claro a cada dois anos parece ser difícil de entender) é que não se pode hesitar diante do eleitor, pois este, como o Django da minha infância,  não perdoa. Vota!

Valter Caldana

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SOCIEDADE

Me posicionei a favor da saída da sede do governo do Morumbi desde antes da eleição para governador, há dois anos.
Isto porque eu já defendia que isso acontecesse há muitos anos. E, indo além, defendia e defendo que o Palácio deve ser vendido e o Governador deve morar no centro da cidade. Há inúmeros imóveis tombados capazes de abrigá-lo e o dinheiro da venda do Morumbi pode ser empregado na adaptação e restauro do imóvel.
Dito isto, vamos ao concurso.
Execente que tenha sido feito pelo IAB.
Deu credibilidade e, sobretudo, dimensão adequada à uma operação necessária e que precisava, como precisa, estar acima e além de questões de curto prazo. Eleitorais ou político partidárias.
Cabe agora ao IAB avançar e discutir a arquitetura e urbanismo vencedora do concurso com a sociedade e a arquitetura e urbanismo vencedora e as não vencedoras com a profissão, em especial dentro das escolas de arquitetura. Estará, então, cumprindo o ciclo completo de seu papel, de suas funções neste processo.
Já passou da hora de se organizar uma exposição leve e itinerante, facilmente instalável nas escolas para que neste contexto o IAB leve os colegas participantes a debater com os estudantes.
E de instalar uma tenda enorme na Princesa Isabel, no terminal cheio de gente, com o projeto, cheio de imagens vídeos e maquetes físicas com estudantes monitores explicando o projeto e colhendo opiniões o dia todo.
Custo disso? Dinheiro de troco, traço, diante da operação financeira e econômica em si mesma.
Agora vamos à operação em si.
Desde que foi oficializada e lançadas as bases do concurso venho alertando para incoerências, teimosias e anacronismos que podem colocar todo o processo na gaveta. A saber e a verificar.
Mas, tudo isso, para chegar ao ponto que tem sido fortemente apontado, de que o projeto é segregador, que visa tirar a população pobre e preta da região para valorizá-la e auferir ganhos sobretudo para a esfera privada.
Pois bem. Aí estamos mais uma vez cometendo o mesno erro das últimas décadas.
Não é a operação ou o projeto vencedor que vão provocar mais segregação, desigualdade, remoções, desumanidade. Até porque, manter a população lá é tão simples quanto colocar uma meia e deveria ser tão automático quanto respirar.
O problema, e este é o erro a que me refiro, é que os efeitos nocivos do projeto, apontados, não são efeitos do projeto. Não são sequer efeitos.
Os efeitos nocivos são decisão política preliminar, fruto de uma posição hoje hegemônica na sociedade que continua apostando no eugenismo, no higienismo e na segregação, no isolamento como premissas qualitativas para a construção da cidade, sobretudo da imagem da cidade.
Qualquer que fosse o projeto, fosse ele idealizado pela Jane Jacobs, pelo Jan Ghel (vide o Anhangabau) ou mesmo pelos movimentos profissionais e pelos populares daria na mesma, com diferenças tópicas..
E por que?
Pelo que eu disse acima. Porque manter, incluir, incoeporar não são premissas, não fazem parte do programa. Porque a sociedade ainda não incorporou a integração e a diversidade ao seu programa qualitativo.
Nem a sociedade, nem seus agentes políticos, nem seus agentes econômicos e nem seus agentes técnicos incorporaram.
Entender a segregação como consequência do processo e não elemento inerente a ele é um erro tão primário quanto combater a sombra do moinho de vento. Eu prefiro, e me dedico a isso há meio século, combater os moinhos.
Insisto: sob este aspecto a questão não está dada pelo projeto ou como uma sua consequência. Ela estaria presente qualquer que fosse o projeto.
A questão é saber qual o projeto, para a cidade, que deseja a sociedade.
Amanhã, na hora de votar, pense nisso.
E vote.
VIVA A DEMOCRACIA
não apenas eleitoral, mas como
valor inalienável da sociedade !!

Valter Caldana

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